quarta-feira, 3 de junho de 1998

Educação

Na sala o casal tomava chá. No chão debruçado sobre algo, o filho brincava.Batem à porta, o casal entreolha-se com expressões de “quem será?”. Ele levanta-se e vai abrir a porta. É uma amiga.
ELE – Olha que ela é!?...Há tanto tempo! ‘Tás boa?
Cumprimentam-se.
VISITA – Bem, bem... então e vocês?
Ele leva a visita até ao sofá e a anfitriã levanta-se agarra nas mão da amiga e trocam beijinhos.
ELA – ‘Tás boa?
VISITA – E tu como estás?
Ela ainda agarrada às mão da visita afasta-a um pouco exclamando:
ELA – Meu Deus como estás linda!... Mas senta-te, senta-te.
Sentam-se e ele, que tinha estado com um olhar comovido a assistir à cena, senta-se na borda da cadeira e, pegando no bule, pergunta à visita:
ELE – Chá?
VISITA – Pois, é chá!
Responde-lhe a visita com um ar muito sério. Ele pestaneja e, encolhendo ligeiramente os ombros, poisa o bule na mesa. Pega seguidamente num pratinho de bolachas e pergunta, virando-se novamente para a visita:
ELE – Bolachas?
VISITA – É, é... são bolachas!!
Responde-lhe a visita já com um ar um pouco admirado. Ele faz uma cara de “o que é que se está a passar!?”, mas resigna-se e encosta-se ao sofá.
Entretanto a anfitriã, inclinando-se na direcção da visita, pergunta:
ELA – Então como vai o teu Manelito?
VISITA – Ah!... sabes, ele tem andado um pouco preguiçoso, então para ir à escola!? Nem queiras saber, faz birras, diz que não quer ir... enfim... é uma cá uma dor de cabeça!
ELA – Pois olha que nós com o nosso Joãozito, nunca temos esses problemas.
VISITA – Ah é !?... Então como fazem isso?
ELE – Isso!?
Interrompe o dono da casa com um ar muito satisfeito consigo próprio, e chegando-se à frente:
ELE – Sabes? Nós estudamos!...
E encostam-se de novo, continua:
ELE – E chegamos à conclusão que não vale a pena contrariar.
ELA – É verdade!
Agora é ela que interrompe muito entusiasmada:
ELA – Desde muito pequeno que ele está habituado a seguir o seu caminho. Nós nunca o pressionamos, e assim evitamos futuros traumas.
A visita acena a cabeça com admiração perante o que lhe parece conceitos muito avançados.:
VISITA – ... nunca tinha pensado!... realmente...
Entretanto ele dá uma olhadela ao relógio e, virando-se para o filho que continuava entretido não ligando a mínima ao que se passava à volta, pergunta:
ELE – Filhote, não está na hora de ires para a escola?
O filho não lhe responde, e o pai olha para a visita, que apenas agora parece dar pela presença do rapaz, com uma expressão de “tadinho está tão entretido!”, e voltando-se de novo para o filho:
ELE – Olha que está na hora de ires para a escola, Joãozito.
FILHO – Ah, não me apetece...
Responde-lhe o filho com voz de mimada e sem voltar a cabeça.
A mãe intervém, então, em tom apaziguador:
ELA – Pronto, pronto, ‘tá bom. Vais amanhã, ‘tá?...
FILHO – Então quer dizer que posso ir ter com os meus amiguinhos!?
Diz ele levantando-se em todo o seu tamanho de mancebo em idade de ir para a tropa.
A visita abre muito os olhos e a boca enquanto o casal, olha embevecido com o seu rebento, e a mãe diz:
ELA – Claro, mas tem cuidado!...
O rapaz sai da sala dizendo:
FILHO – Eu só vou ali beber umas “bejecas”.

Sem comentários: